Essa arcaica regra de etiqueta – tão usada e abusada – que na véspera de Rosh
Hashaná nos exige que desejemos que se cumpram todas as aspirações do próximo,
está muito além da minha capacidade de aceitar o inaceitável. Eu, a verdade seja
dita, o único que quero, anseio, aspiro e desejo, é que se cumpram todos os
desejos, os anseios e as aspirações de quem quer que seja, desde que eles
contenham no seu ventre apenas e unicamente bons propósitos que não gerem
sofrimento alheio.
E entre esses meus desejos está o de que não se cumpram os anseios da extrema
direita judaica em relação a Israel, porque neles prima uma supremacia judaica
inexistente e germina um desprezo repugnante pelo povo palestino; e o de que não
se cumpram os desejos dos colonos judeus em relação aos assentamentos, porque
eles traduzem um messianismo incompatível com os valores do judaísmo, já que têm
com base a usurpação de bens e a expulsão da população; e o de que não se
cumpram os desejos de Sharon, Netaniahu e Cia. em relação ao futuro do Estado de
Israel, porque sua realização representaria a morte pura e simples do Estado de
Israel livre, laico e democrático pensado e instrumentado pelos seus fundadores;
e o de que não se cumpram os desejos dos inimigos do povo judeu em relação ao
nosso destino, porque significaria o fim físico do nosso povo; e o de que não se
cumpram os desejos dos anti-semitas em relação a nós, porque seria a reprise de
Auschwitz, Treblinka e sucursais. Muito pelo contrário, desejo com fervor quase
religioso que todos eles não passem de ser velhos, reumáticos e maltrapilhos
desejos irrealizados e irrealizáveis.
Quero que os desejos de todos os terroristas que matam em nome de seja qual for
o seu deus, se cumpram contra si mesmos; e que os desejos de todos os fanáticos
de todas as tendências, morram nos trabalhos de parto; e que todos os desejos de
vingança se transformem num afiadíssimo bumerangue.
Desejo que se consolide um projeto que conduza a uma paz justa entre Israel e
Palestina que finalmente permita dormir em paz a uns e a outros, e que se
realizem os desejos daqueles que não desejam impor a sua vontade como se ela
fosse a explicitação de um desejo divino.
Por tudo isso, espero que no jantar de Rosh Hashaná, todos os que apostamos pela
Paz digna e verdadeira e não pela Pax imposta e portanto fraudulenta, nos
embebedemos com uma enorme dose de esperança, e os que planejam a vitória final
de uns sobre os outros sem importar-se com o enorme custo em sangue inocente que
tal empreitada cobraria, que se engasguem bebendo o seu próprio ódio e que
tropecem nas pedras que forem semeando no caminho.
Essas são as condições sine qua non para desejar a quem as aceitar, um
SHANÁ TOVÁ UMETUKÁ!
(01 de outubro/2005)
CooJornal
no 444