Ainda que o incêndio de algumas sinagogas em Gaza por uma multidão enlouquecida
e enceguecida não fique a dever nada em crueldade e maldade à particularíssima
noite dos cristais na Alemanha, ou à queima generalizada de livros censurados
pelo regime nazista, não escreverei uma só palavra sobre as pessoas que o
fizeram nem sobre os possíveis motivos do ódio que os impeliu. Deixo esse tema
para os propagandistas de ambos os bandos.
Ainda que esses incêndios pudessem ter sido evitados pelo governo israelense,
desmantelando essas sinagogas tal e qual fizeram com mais de duas mil casas e
fábricas dos colonos, não escreverei nem sequer uma simples palavra sobre a não
descartada hipótese de que tenham sido deixadas em pé com a suposição de que
ocorreria o que aconteceu, e que tal fato execrável produziria importantes
dividendos nos campos da propaganda e das relações públicas. Desse tema
encarregar-se-ão os jornais e os canais de televisão, cada um deles olhando
apenas o lado da história que mais lhe convier. Uns olharão o pavio, outros o
fósforo, e muitos olharão para outro lado. Como sempre.
Da mesma forma em que não acusei o povo americano de imprevisão em tudo o que se
relaciona com o furacão Katrina e suas conseqüências, tampouco acuso agora ao
povo palestino de ter chegado ao extremo de incendiar casas de oração,
transformando uma luta política justa, numa agressão religiosa intolerável.
Acuso única e exclusivamente às autoridades palestinas, porque elas, sabendo o
que ocorreria, não o impediram. Não ficaria surpreso se viesse a ser confirmado
que alguns deles foram os planejadores dessa infâmia.
Acuso às autoridades palestinas de se terem deixado levar pela irracionalidade
que lhes ditavam os seus intestinos e não pela Razão que deve imperar
obrigatoriamente nas questões de Estado.
Os responsáveis políticos dessa barbárie digna dos piores tempos da Inquisição e
dos não muito longínquos campos de concentração ou fornos crematórios
incluíram-se definitivamente – pelas suas ações e/ou omissões – na lista negra
dos que não podem nem devem negociar em nome do povo palestino.
Se deixarmos que aqueles que permitiram incendiar sinagogas não sejam punidos –
e isso em nome de um pragmatismo inaceitável - será a prova definitiva de que o
século XXI é o cenário sobre o qual se desintegra a sociedade dos humanos, e dos
seus escombros surge e frutifica a indignidade com forma de governo, o fanatismo
religioso como bandeira de guerra, e a força bruta como consigna.
(17 de setembro/2005)
CooJornal
no 442