03/09/2005
Número - 440

ARQUIVO
BRUNO KAMPEL

 
Bruno Kampel


O MÉDICO É O MONSTRO

Diferentemente das doenças físicas, as quais devem ser abordadas pelo médico a partir dos seus sintomas para poder encontrar um tratamento eficaz, a Política deve ser julgada de trás para frente, do fim para o princípio, comparando-se o resultado final com o diagnóstico inicial, ou seja, verificando se o tratamento aplicado tinha relação com os sintomas e conseguiu acabar com a doença e os seus efeitos colaterais.

O PT soube detectar com precisão a enfermidade que corroía o conteúdo e o continente do sistema político brasileiro, e sugeriu no seu programa de governo um tratamento de choque geral e doloroso para erradicar o mal pela raiz. É por isso que dá pena, que provoca angústia, que gera dor, que produz desespero e ódio, constatar que, mesmo antes de aplicar a primeira dose do remédio, o médico contagiou-se e caiu vítima de igual moléstia.

As lideranças do PT - principalmente Lula - demonstraram o que pelo menos alguns já sabíamos: que o discurso e as boas intenções não são armas suficientemente destrutivas na hora de enfrentar-se à adulação pessoal e à corrupção institucional, pois enquanto a primeira serve para encher e anestesiar o ego dos destinatários, a última é usada para encher os bolsos das pessoas e dos partidos que em nome do povo exercem o poder, e em nome desse Poder se locupletam à custa do povo.

A conseqüência é evidente e não sai das manchetes da realidade: o PT acabou bem acabado e para todo o sempre, e Lula passará à História como aquele líder carismático que tendo nas mãos a possibilidade real, concreta, tangível, de mudar para melhor os destinos do país, deixou que a sua fome atávica e a sua incultura genérica falassem mais alto, optando por satisfazer carências e sonhos de pobre, ao invés de aplicar o tratamento que prometera ao povo brasileiro. Os ternos de seda, os vinhos famosos, os perfumes franceses, os tapetes persas, puderam mais do que a desnutrição e a miséria que se alastra sem freio por toda a geografia nacional.

Mais do que pena pelo triste e definitivo fim do sonho que o PT carregava na mochila, ou pelo irreversível escorregão ético de Lula e seus profetas, sinto muita, muita raiva, porque constato impotente que o PT, que Lula e seus ministros, que o governo e seus programas, apagaram a luz no fim do túnel. A única luz do único túnel.

E agora, José?... Pois é... Tudo como dantes no quartel de Abrantes.




(03 de setembro/2005)
CooJornal no 440


Bruno Kampel  é analista político, poeta e escritor.
Reside atualmente na Suécia.
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