Bruno Kampel
SIONISMO É RACISMO? |
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Não, Claro que não é. Da mesma
forma que Islamismo não é terror nem sexo é promiscuidade nem dinheiro é
necessariamente o produto da exploração do homem pelo homem.
O que sim é verdade é que existem sionistas racistas, e muçulmanos terroristas,
e não poucos degenerados sexuais, e não menos capitalistas sem entranhas.
No saber e querer diferenciar a uns dos outros, os doentes de ódio dos sãos de
espírito, os inimigos mortais dos amigos leais, é onde reside a principal
qualidade que nos faz diferentes dos irracionais. Hitler e Torquemada, Mussolini
e o Mufti al-Husseini, não o souberam nem o quiseram, e por isso nos legaram
como herança a ignomínia das suas idéias, a sem-vergonhice dos seus atos, e
bastantes páginas negras da nossa História escritas com o sangue inocente das
suas vítimas.
Hoje e agora, as minorias fundamentalistas islâmicas, judias e cristãs,
tropeçando de novo na mesma pedra, transitam por igual caminho em direção ao
mesmo precipício.
O fundamentalismo islâmico, com os seus ataques suicidas, que além de matar
judeus inocentes da forma mais covarde concebida pela mente humana, salpicam com
esse sangue a honra e a imagem da sua própria religião, já que o nome de Alá
fica irremediavelmente associado a essa barbárie cometida em seu nome.
O fundamentalismo judeu, organizado em seitas religiosas e gangues laicas, ao
tentar impor suas loucas idéias de um deus vingativo e exclusivo, e de um Grande
Israel Bíblico do ponto de vista territorial, ao qual o povo judeu renunciou
expressamente ao assinar a partição da Palestina, usando para tal fim não apenas
o discurso ou a propaganda, mas as armas e o assassinato dos líderes do Estado
de Israel (começaram com Rabin e agora até Sharon – seu aliado natural até uns
meses atrás – está na mira deles).
O fundamentalismo cristão, incitando ao ódio às outras religiões e apoiando e
aplaudindo a tortura dos inimigos de seu deus todo-poderoso, transformando o
conflito numa guerra santa contra o Islã, e o exército dos Estados Unidos em
Soldados do Cristianismo (por analogia, os novos cruzados).
Compete a todos os que não nos deixamos arrastar por slogans pré-fabricados ou
por medos manipulados pelos porta-vozes do além, enfrentar-nos a esse tudo ou
nada que eles propõem, construindo uma estrada transitável que conduza à
concórdia e não ao cemitério; a bom porto e não ao naufrágio da esperança.
Visto isso, só resta então formular a pergunta do milhão: afinal, o que é
sionismo?...
A minha modesta resposta a esse enorme interrogante começa no início do túnel do
tempo, quando o povo judeu abandonou a terra prometida por razões alheias à sua
vontade (ou sumir ou sucumbir).
Durante milênios então, o sionismo hibernou no útero de uma frase simples,
representando apenas a verbalização de um desejo irreprimível, um sonho
condensado em poucas e premonitórias palavras: no ano que vem em Jerusalém
(be shaná haba’á birushaláim, em hebraico).
E assim o sionismo, que nem mesmo sabia que esse era o seu verdadeiro nome,
vivia e sobrevivia em estado latente dentro dessa simples frase que foi passando
de geração em geração, de boca em boca, de coração a coração, até um dia
qualquer do um ano qualquer do século XIX, em que alguns judeus decodificaram a
vontade de grande parte da diáspora de voltar para casa, considerando que havia
chegado a hora de traduzir a mensagem genética contida na pequena frase herdada,
à linguagem dos fatos, propondo táticas e estratégias que permitissem
transformar o exílio imposto em retorno; a prece milenar em pátria.
E foi assim que esse sionismo ganhou nome próprio, sobrenome comum e um projeto
de viabilização, começando então a construção de uma ponte que unisse o sonho
herdado à realidade possível.
Era o começo do fim do desarraigamento para todos aqueles que assim o quisessem,
ainda que as resistências não fossem poucas nem banais, já que a maioria do
Establishment religioso se opunha (e ainda o faz depois de 57 anos de
independência) esgrimindo argumentos paridos na diáspora, sem qualquer relação
com os livros sagrados, segundo os quais o retorno só será permitido com a
chegada do Messias.
Essa foi a razão pela qual o Sionismo pioneiro foi fundamentalmente laico, e
ainda o é, apesar de ter deixado de ser um projeto virtual para transformar-se
no Estado de Israel real. Não o Israel maximalista dos fundamentalistas, mas sim
o Israel possível dos realistas.
Indivíduos primeiro e grupos depois, foram pouco a pouco desembarcando do navio
do tempo nos portos da velha pátria, e iniciaram a empreitada, plantando
famílias no deserto e nas cidades; secando pântanos e sobre eles implantando
produtivas fazendas coletivas; erigindo escolas para todos os alunos, hospitais
para todos os doentes e prisões para todos os criminosos.
Isso é sionismo: o puro e simples direito de reconstruir a casa nacional sobre
parte do território primitivo e nela acolher a todos os que desejarem fazer a
viagem de volta (as fronteiras – não o esqueçamos - foram democraticamente
aceitas pelos representantes do povo de Israel, renunciando a qualquer
reivindicação de territórios fora dos limites aprovados).
Hoje, entretanto, constatamos com pesar e temor, que no corpo do Estado de
Israel crescem e se multiplicam pequenos tumores malignos cujas metástases
comprometem seriamente a saúde do país. É o tal do hiper-sionismo ou
mega-sionismo, inspirado no fundamentalismo religioso radical, aliado a uma
visão fundamentalista laica de extrema-direita, de ignorar todo o trabalho feito
para a construção do Estado de Israel, das suas leis, das suas fronteiras, das
assinaturas nos acordos internacionais, do respeito aos direitos humanos de
todos os humanos, com a malsã intenção de implantar a pátria bíblica dos contos
de fadas, tanto no que respeita à sua dimensão territorial (expulsando a milhões
de palestinos de suas terras e anexando-as) quanto à imposição de um Estado
clerical ao estilo das repúblicas islâmicas mais retrógradas. E isso – que não
caiba nenhuma dúvida ao respeito - não é sionismo. Isso é pura e simplesmente
anti-sionismo, e deve ser combatido por todos aqueles que vêm no Estado de
Israel (e não na terra de Israel) a tradução fidedigna do sonho gerado e gestado
pelo povo judeu ao longo dos séculos no seu caminhar diaspórico.
O sionismo é um direito e não um dever, e o Estado de Israel é o fecho de ouro
dessa travessia de ida e volta do povo judeu.
(25 de junho/2005)
CooJornal
no 426
Bruno Kampel é analista político, poeta e
escritor.
Reside atualmente na Suécia.
bruno.kampel@gmail.com
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