Bruno Kampel
ATEUS ESPERANDO UM MILAGRE
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Sessenta e cinco de cada cem
norte-americanos acreditam em fantasmas.
Trinta e seis de cada cem norte-americanos estão convencidos de que vivem entre
nós muitos extraterrestres, e não são poucos os que afirmam tê-los visto
pessoalmente.
Setenta e cinco de cada cem telespectadores da rede Fox não têm nenhuma dúvida
de que Saddam Hussein é o responsável dos atentados do dia onze de setembro.
Sessenta e seis de cada cem membros da população adulta dos Estados Unidos
acreditam que Saddam Hussein e Bin Laden são cúmplices.
Cinqüenta e quatro de cada cem norte-americanos acreditam em discos voadores e
muitos deles afirmam tê-los visto.
Cinqüenta e dois de cada cem norte-americanos não sabem qual é a capital do
estado de Nova Iorque.
Cinqüenta de cada cem norte-americanos maiores de idade jamais votaram nem têm
intenções de fazê-lo no futuro.
O presidente é eleito por aproximadamente 20% da população.
O candidato mais votado pelo povo pode perder a eleição (como Al Gore no ano
2000) porque não é o povo que escolhe o presidente.
Em oito Estados mais de quatro milhões de cidadãos estão legalmente impedidos de
votar pelo fato serem portadores de antecedentes penais (ainda que tenham
cumprido a totalidade da pena),
Setenta e quatro de cada cem norte-americanos acreditam piamente que o céu
depois da morte é um lugar concreto e não um conceito abstrato.
Cinqüenta e três de cada cem norte-americanos são favoráveis à pena de morte,
ainda que exista o risco de que depois de executada se comprove que o condenado
era inocente.
Também é importantíssimo recalcar o fato de que 95% dos governos de todo o mundo
aceitarão – como sempre aceitaram – seguir as regras do jogo impostas por
Washington, se não ao pé da letra, pelo menos não combatê-las publicamente, como
no caso atual da Guerra do Iraque, quando alguns governos que nos discursos se
opõem a essa guerra, na realidade mandam tropas para participar nela, e outros,
como a felizmente desaparecida Espanha de Aznar, fazem ouvidos moucos aos apelos
majoritários do povo e mandam tropas para morrer em nome da supremacia
norte-americana.
Não menos crucial é o fato inconteste de que o interesse econômico prevalece
sobre os direitos humanos de todos os humanos em muitíssimos paises do mundo, o
que os irmana ideologicamente com o governo atual dos Estados Unidos.
Tampouco podemos esquecer que naqueles paises onde o povo sabe pouco e não quer
saber mais, o que realmente importa para ganhar eleições é a imagem e não a
mensagem; o jogo de cena y não os fatos; a mentira agradável e não a verdade
dura e crua. Por isso é que tantos presidentes que falavam mas não faziam; que
pareciam mas não eram; que brilhavam mas não era ouro, passaram pelos governos
de quase todos os paises de quase todos os continentes.
E assim sucessivamente até vomitar ou claudicar, porque infelizmente - no caso
das eleições americanas do dia 2 de novembro de 2004 - tanto os republicanos
quanto os democratas dependiam de uma parcela importante do povo norte-americano
que é totalmente tele dirigida; de uma maioria do povo norte-americano que é fã
incondicional da simplificação tipo preto no branco; de uma maioria do povo
norte-americano que é metodicamente amestrada desde a mais tenra infância para
deixar-se seduzir por tudo aquilo que parece ser verdade e desejável não por
aquilo que realmente o é; de uma maioria do povo norte-americano que crê
piamente em bruxas escondidas nos telhados, e em milagres por encomenda, e em
proteção divina para os que pensam como eles e castigo eterno para os que
divergem; de uma maioria do povo norte-americano que tem como profeta
indiscutível a algum dos milhares de predicadores televisivos que inundam e
infestam os horários nobres de quase todos os canais do país do norte.
Moral da história? Ela é tão curta quanto dolorosa, e não requer dos serviços de
explicadores profissionais que a traduzam a linguagem popular, porque consta de
três simples palavras que refletem com claridade o próximo passo:
Socorro! S.O.S! Help!
Bruno Kampel, Suécia, 3 de novembro de 2004
P.D.: Se os últimos votos que faltam contar em Ohio desmentem o dito até aqui e
invertem o resultado, serei então o mais feliz dos enganados e passarei a
acreditar em milagres como quem acredita em si mesmo.
(06 de novembro/2004)
CooJornal
no 393
Bruno Kampel é analista político, poeta e
escritor.
Reside atualmente na Suécia.
bkampel@home.se
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