Braz Chediak
MATANDO
O BICHO
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Há muitos anos escrevo crônicas para jornais e sites, mas
nunca me passou pela cabeça que deveria abrir o mês de janeiro com um
balanço do ano que passou ou, simplesmente, revelar os projetos para o que
começa. Por que deveria ser uma crônica especial? O que é que
este mês tem de diferente dos outros? Os dias continuam com 24 horas, as
horas com 60 minutos e os minutos com 60 segundos. As chuvas, como todo
ano, estão aí e, com elas, a multiplicação das sementes e o aparecimento
de pássaros que, misteriosamente, somem por um longo período. Aliás,
alguém sabe para onde vão os tizius, os coleirinhas, os bigodinhos, etc.,
etc. nas outras estações do ano?
Dizem que primeiro de janeiro é o dia ideal para:
deixar de fumar, deixar de beber, deixar de comer gordura, acordar cedo,
fazer exercício físico, comer mais saladas, caminhar uma hora por dia,
reler a obra de Proust, o Ulisses, de Joyce, fazer as pazes com a mulher
ou o marido, dar mais atenção aos filhos, ser mais participativo na
empresa, etc., etc.
São promessas fáceis, mas que podem podem ser
adiadas para depois do carnaval, o que me faz lembrar o poema de Ascenso
Ferreira:
“Hora
de comer, comer.
Hora de beber, beber.
Hora de dormir, dormir.
Hora de trabalhar
Pernas pro ar que
ninguém é de ferro”
Mas, já que não fizemos balanço, nem temos
projetos, que tal sonharmos? Sonhos não custam nada e podem nos levar mais
longe que qualquer carro, ônibus ou avião, sem o desconforto de sair da
cama, ir à garagem, rodoviária ou aeroporto, esperar, carregar mochilas e,
suplício dos suplícios, ter na poltrona a seu lado um desses caras que
gostam de conversar “para passar o tempo”.
Os sonhos são livres. Quem deseja ser rico, pode
sonhar que ganhou na Mega-Sena acumulada e que está jantando, à luz de
velas, no terraço do Copacabana Palace ou tomando um café num bistrô em
Saint Germain de Près.
Para quem prefere o amor, que tal um namoro com a
magra Gisele Bundchen ou com a fofa Preta Gil? Se o seu caso for as
baixinhas, vai de Sandy, com seu jeitinho terno, seu olhar tímido e sua
voz bonita. Não? Você gosta das altas? Bom, então dá uma olhada na Nikole
Kidman com seus ferozes olhos azuis.
E as mulheres? Preferem o Brad Pitt ou o Denzel
Washington? Ah, você é nacionalista. Então vá de Rodrigo Santoro ou de
Antonio Fagundes. Mas não se esqueça: A beleza – que me perdoe o
Vinícius – não é fundamental. Nelson Rodrigues, sob pseudônimo de Myrna,
diz a uma de suas leitoras: “Pior do que Quasímodo, pior do que o Fantasma
da Ópera, pior do que Boris Karloff – é o bonito oco, que não liga duas
idéias, que jamais leu um verso, nem mesmo uma manchete, que é sensível e
inteligente como um paralelepípedo”. Mas, como estamos falando de sonhos,
não custa nada admitir que seu amor é bonito, inteligente, culto, educado,
carinhoso, viril... Ah, e rico!
E você, homem ou mulher, como vai seu corpo? Na realidade,
você anda meio gordinho(a), ocioso(a), comendo feito um condenado. Mas no
sonho... No sonho é um(a) atleta, barriga tanquinho (ainda que eu não
saiba o porque desse termo: “barriga tanquinho”), pele perfeita, cabelos
sedosos, etc., etc. Se você for leitor, faz as mulheres suspirarem. Se for
leitora faz os pedreiros assobiarem. (Tenho uma amiga que diz saber que
seu corpo está em forma quando os pedreiros assobiam ao vê-la passar.
Agora, ao escrever esta crônica, penso que se ela saísse mais a cidade
seria mais alegre, seria uma sinfonia de assobios).
Mas, voltemos ao assunto: E a cabeça? Está
com preguiça de ler, usa a desculpa de “não tenho tempo”, boceja diante de
um livro? Não faz mal, no sonho você é poeta, romancista, músico, etc.,
etc. Um(a) intelectual, em suma.
Sim, meus três ou quatro leitores. A vida também é
feita de sonhos, precisamos deles para dar uma escapulida da realidade.
Mas é bom pensar que sempre voltamos a ela e, para realizar qualquer coisa
é preciso trabalhar, trabalhar, trabalhar. Em todo caso, como é Ano Novo e
já que “se correr o bicho pega, se ficar o bicho come”, vamos erguer nossa
taça e, juntos, matar o bicho. Nada de esquentar com o trabalho, que só
começa dia dois. Sei que “o trabalho é a coisa mais bonita do mundo, eu
sou capaz de ficar um dia inteiro vendo os outros trabalharem”. Por isto,
tim-tim. Que 2008 seja um ano pleno para todos nós e de muito trabalho...
para vocês!
(18 de abril/2009)
CooJornal
no 628