O jornal americano Beaufort Gazette
noticiou, há poucos dias, um fato curioso: “um americano que havia
recebido o coração de um suicida, Terry Cottle, em um transplante, há 13
anos, se matou com um tiro na garganta, do mesmo jeito que seu doador.
O mais interessante é que, ao procurar a família de Terry para
agradecer, se apaixonou por sua viúva e se casou com ela.
“O fenômeno da herança de traços da personalidade do doador em
transplantados é estudado por cientistas há algum tempo”, e em 2002 a
revista Jornal of Near-Death Studies publicou pesquisa sobre o assunto e
narra a história da professora de dança Claire Sylvia que nunca havia
bebido e, após receber um coração de um jovem que bebia, acordou pedindo
cerveja.
Outro fato bastante noticiado na comunidade científica foi o de outra
mulher, que após receber um rim mudou seu comportamento de maneira
radical, passando a ter os mesmos gostos da sua salvadora. Ela, que
antes só lia revistas e coisas ligeiras, começou a ler Dostoiévski,
Flaubert, Tolstoi e outros autores preferidos da doadora.
O fato, chamado de “Memória Celular” não é raro e desperta cada vez mais
a curiosidade dos pesquisadores do mundo inteiro, confirmando aquilo que
os mestres e monges budistas vêm afirmando há milênios: cada célula de
nosso corpo tem memória própria na qual está armazenada a memória de
todas as outras células em particular, e do Ser como um todo.
Cientificamente, está comprovado, existem algumas semelhanças entre os
DNA de plantas e animais, o que nos leva a crer que a “imortalidade”, da
qual tanto falam os sacerdotes, os místicos, os espíritas, etc., pode
ser um fato.
É claro, não será a imortalidade de ficarmos sentados eternamente junto
a um Deus barbudo, vendo anjinhos voarem à nossa volta, mas de
renascermos como outras formas de vida que, por sua vez, se
transformarão em outras, no contínuo e eclesiástico movimento do
universo.
Cada ser vivo pertence a uma espécie, mas todos pertencemos ao grande e
magnífico OM, o que nos liga eternamente no caminho em direção a Ele.
Na igreja católica Existem santos que são chamados “doutores da igreja”,
como Tomás de Aquino e Agostinho. Mas foi São Francisco quem mais
compreendeu a verdade da unificação de todo o universo, da qual falamos
nesta crônica. Chamou de minha irmãzinha a lua, meu irmãozinho o sol,
minha irmãzinha a água, meu irmãozinho o fogo. Ele se via em tudo e via
em tudo um semelhante. Quem sabe este belo poeta de Assis, já percebia a
existência da “memória celular”, já pressentia que, séculos depois de
sua passagem, seus irmãozinhos carregariam numa pequenina célula toda a
história da raça humana e, principalmente, a história cósmica do
universo?
Esta reflexão me faz pensar em nossa própria história e,
conseqüentemente, na morte que “quanto mais demora, mais perto fica”.
Olhando-a pelo ângulo da transformação, se ela, por um lado, é o fim de
nossa existência, por outro pode ser um rito de passagem, já que “a
Morte nos lembra que é preciso ir ainda mais longe e que ela é a própria
condição para o progresso e para a vida.”.
“Mors janua vitae – A morte é porta da vida” nos ensinam os mistérios.
Da mesma maneira que o Tarô – tão em voga na década de 60 – que, em sua
décima terceira lâmina, simboliza a morte em seu sentido iniciático de
renovação e nascimento, isto é, também uma porta para o futuro.
Mas deixemos a morte de lado e vamos seguir a circularidade da vida,
voltar à notícia da qual falei nos primeiros parágrafos, do homem e das
mulheres que readquiriram a memória das células de um “Ser morto” e
sentiram renascer, em si, seus sentimentos mais profundos: a compreensão
da grande arte ou um vício – no caso da mulher -, o amor e o suicídio,
no caso do homem. Voltamos à integração homem/animal/planta.
Ela não é descoberta nova. No paganismo, os deuses egípcios tinham
cabeças de animais. No catolicismo, o espírito Santo é representado por
uma pomba. Da mesma maneira, as plantas representam o primeiro estágio
da vida, o eterno nascimento, a força vital já que representa a energia
solar, condensada e transformada em ser visível, que pode ser tocado e
consumido.
Animal ou planta, seja qual for o receptador da nossa “Memória Celular”,
sejamos dignos dele, deixando um legado de beleza e de amor. Somos nós
que escolhemos o caminho. CARPE DIEM.