Braz Chediak
AS COISAS
MAIS SIMPLES |
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Leio, maravilhado,
que cientistas anunciaram a descoberta de um novo planeta centena de vezes
maior que a terra. Fico alguns instantes meditando, visualizando o
universo, o Caos perfeito, o Caos de cada instrumento tocando uma nota
diferente mas que, no todo, resulta em harmonia, na grande sinfonia
cósmica, e recolho-me à minha humildade contemplativa.
Como tenho
compromisso de escrever, minimizo a internet, abro o Word e começo esta
crônica que, pretendo, será uma crônica de maravilhamento e humildade.
Maravilhamento por
sentir que nós, pequeninos seres de um planeta pequenino, somos capazes de
descobrir corpos tão distantes no universo que temos vontade de gritar a
descoberta e, ao mesmo tempo, somos capazes de criar obras monumentais
como o David (de Miguelangelo), a Monalisa, a Divina Comédia, as peças de
Shakespeare, as sinfonias dos grandes mestres, etc., etc. Somos capazes de
criar ritmos celestiais e ritmos primitivos. Somos capazes de criar tudo,
somos feitos à imagem, semelhança, sonho e ousadia de Deus.
Crônica de humildade
porque compreendo nossa condição diminuta, menor que uma poeira cósmica,
menor que a mônada e, no entanto damos graças ao criador e compreendemos
que Ele nos fez assim para que se fechasse o círculo da criação que começa
com um olhar, uma carícia, e continua com o encontro de um espermatozóide
e um óvulo microscópico que se fundem e, pouco a pouco, se transforma num
ser único que virá à luz. Um ser cuja inteligência é capaz de descobrir
que, além de nós, longe de nós, existem milhares, milhões de planetas
centenas de vezes maior que o nosso.
São duas horas da
manhã e está chovendo. Interrompo a escrita desta crônica – ela já está em
mim - e sento-me, sozinho, na varanda observando a água, as plantas, a
terra do jardim. Tudo está interligado. A água continua sua missão, que
começou com o mundo, de correr para os rios, matando sedes, fazendo brotar
as árvores, os frutos, os grãos que alimentam a vida, até encontrar o mar.
Escuto as plantas que falam em sua linguagem silenciosa, que só elas
entendem, dando graças à chuva. Por um momento ouço, em minha memória
afetiva, Cartola dizendo que as rosas não falam, “As rosas simplesmente
exalam/o perfume que roubam de ti”. Que bela imagem, que bela homenagem à
mulher amada da qual ainda está presente a imagem, o cheiro, a dor da
separação.
As rosas de Cartola
não falaram naquele momento de imensa tristeza, porque respeitaram a
criação do poema, a epifania do mestre. Benditos sejam os três, poeta,
rosas e mulher por nos legarem esta obra de singela beleza. Benditos os
artistas por compreenderem a simplicidade da poesia que existe em todas as
coisas: no vazio da separação, na descoberta de um planeta ou na
constatação de estrelas que não existem mais.
Bendito sejas,
planeta descoberto, e bem vindo ao nosso convívio. Agora sabemos que
caminhamos juntos nesse infinito OM. Que caminhamos juntos, até que um dia
sejamos todos rastros de luz, e alguém nos louvará como Manuel Bandeira
louvou outras constelações que – quem sabe? - um dia fomos nós:
“Belo belo belo,
Tenho tudo quanto quero
Tenho o fogo de constelações extintas há milênios.
E o risco brevíssimo – que foi? Passou – de tantas estrelas cadentes.
A aurora apagou-se,
E eu guardo as mais puras lágrimas da aurora.
O dia vem, e dia adentro
Continuo a possuir o segredo grande da noite.
Belo belo belo,
Tenho tudo quanto quero.
Não quero o êxtase nem os tormentos.
Não quero o que a terra só dá com trabalho.
As dádivas dos anjos são inaproveitáveis:
Os anjos não compreendem os homens.
Não quero amar,
Não quero ser amado.
Não quero combater,
Não quero ser soldado.
- quero a delícia de poder sentir as coisas mais simples.
(29 de dezembro/2007)
CooJornal
no 561