Braz Chediak
OS MELHORES CONTOS
DE LOUCURA |
|
Bela e importante a antologia OS MELHORES CONTOS DE
LOUCURA organizada por Flávio Moreira da Costa. Nela podemos nos
aprofundar e, por que não?, nos divertir com alguns dos melhores contos da
literatura universal sobre o assunto e relembrar vários de nossos grandes
escritores que transitaram por este território sombrio ou fantástico da
mente humana.
Ao lado de Antonin Artaud, Van Gogh, Tchekhov, Bukowski,
etc., encontramos nosso magistral Machado de Assis, o misterioso Samuel
Rawet (o mesmo de O Terreno de Uma Polegada Quadrada), Maura Lopes Cançado,
Lima Barreto, Carlos Sussekind, e tantos outros, cada um com seu
testemunho e sua arte que Flávio, sabiamente, dividiu em Loucura e
Cotidiano, Loucura e Drogas, Loucura Clínica e
Loucura e Testemunho o que nos permite ler com mais clareza, ter um
discernimento maior deste grande mistério da mente e da alma humana que
ainda chamam “loucura”.
São 34 textos apaixonantes que, longe de serem didáticos,
contam histórias. Flávio, como grande escritor que é, sabe que a história
é necessária para que a literatura continue vivendo com sua força criadora
e demolidora, crítica e poética. Viver é contar. Aliás, o melhor exemplo
desta afirmativa está em AS MIL E UMA NOITES onde Cheherezade
precisa contar uma história por noite para continuar viva. Aliás, neste
mesmo livro um personagem – o médico de Duban – não tem permissão do rei
para contar a história do crocodilo e morre decapitado. Como vingança,
deixa de presente, ao rei que o condenou, um livro cujas páginas estão
coladas e em branco. O rei as folheia, molhando os dedos nos lábios,
procurando a história que não existe , se envenena e morre. “O livro que
não conta nenhuma narrativa mata. A Ausência de narrativa significa a
morte.” Mas este é outro assunto, que já foi tratado por Borges, por
Piglia, por Todorov e tantos outros, de maneira definitiva.
Voltemos a OS MELHORES CONTOS DE LOUCURA, já que meu
espaço é pequeno e nele não cabe análises mais profundas ou demoradas.
Deixemos a profundeza para a leitura da obra – a profundeza do prazer, já
que os contos são, em sua maioria, revestido de humor, de ternura, de
humanidade. Flávio Moreira da Costa soube, como sempre, peneirar o que há
de melhor no gênero para nos presentear.
Cabe também um elogio aos tradutores. Boris Schnaiderman,
Rubens Figueiredo, J. Guinsberg, José Paulo Paes, Léo Schlafman, Celina
Portocarrero e o próprio Flávio, são mestres neste trabalho. A eles
devemos muitas revelações e o respeito aos traduzidos.
Você poderá se comover com Pirandello, rir com Machado,
redescobrir Qorpo Santo, etc., etc. Você poderá viajar por este universo
infinito. E “Como são infinitas as formas de enlouquecer! Por embriaguez,
por paixão, por abandono, por estupidez, por desmesura, por vaidade, por
medo – a lista é interminável”, como disse Maria Rita Kehl sobre esta
antologia. Você pode, como eu, recordar momentos sublimes da união das
Artes, como, por exemplo, a interpretação de Rubens Corrêa em DIÁRIO DE
UM LOUCO, na década de 60, em espetáculo dirigido por Ivan de
Albuquerque, que foi um marco de beleza em nosso teatro. Agora, este mesmo
conto está novamente entre nós, grandioso, belo, como tudo que Gogol
escreveu.
“A inconsciência de uma pedra que cai é uma inconsciência
nula: a pedra não tem o menor sentimento da sua queda”, nos afirma Bérgson
em A Evolução Criadora. A inconsciência daqueles que não percebem que
esses “loucos geniais” – aqui representados nesta antologia – são muitas
vezes os formadores da “consciência não criada da raça”, é mutiladora,
paralisante, mas talvez seja por causa dela, em reação contrária a ela,
que existiu um Van Gogh, um Artaud, um Poe, um Machado de Assis e seu
Alienista e todos estes criadores que aqui se encontram, e por mais
paradoxal que seja, aqui, a palavra “encontro”, ela nos trás a vida.
“Caos é a palavra que usamos para explicar ordem não
compreendida”, já nos ensinou Miller. “Loucura” é a palavra que usamos
para designar a lucidez que não possuímos. OS MELHORES CONTOS DE
LOUCURA é um caminho para que começamos a entender, admirar e amar a
esses “malucos geniais”, que nos deixaram grandes tesouros, grandes
riquezas, que agora se encontram nas páginas deste livro. Boa leitura e
CARPEM DIEM.
(26 de maio/2007)
CooJornal
no 530