01/12/2021 Ano
24 Número 1.250
ARQUIVO BRAZ CHEDIAK
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Braz Chediak
A FEIJOADA
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Dirigiram-se à mesma mesa, ao mesmo tempo.
Percebendo que a mulher ficara sem jeito, indicou-lhe a cadeira: - Por
favor, a senhora chegou primeiro.
Ela agradeceu, ele insistiu e ela
sentou-se. Como ele ficara de pé e o restaurante estava cheio, sugeriu:
- Se o senhor não se importa...
E indicou-lhe a cadeira em frente.
Ele sentou-se. Apresentaram-se, cada um dizendo seu nome e, quando o
garçom chegou, pediram quase ao mesmo tempo uma feijoada.
Diante
daquela palavra mágica “feijoada”, os olhos se encontraram. Ela teve um
leve rubor. Ele sorriu: - Estou com fome... - Eu também!
O
garçom voltou, deixou as tigelas fumegantes e se foi. Ele pegou a colher e
perguntou se podia servi-la. Ela aceitou, balançando a cabeça, e disse:
- Só de olhar me dá água na boca!
Ele serviu-lhe o arroz,
serviu-se, pegou a vasilha de couve: - Você gosta? - Adoro. Eu
não como feijoada desde que... - Desde quê? - Desde que me
separei... meu marido... - Seu marido não gostava? -
Gostava. No começo muito. Depois ele começou a fazer dieta. Preferia
saladas. Começou a comer fora.
Ele, quase cochichando: - Eu não
troco feijoada por nada. É muito gostosa. - Você acha? -
Acho.
Mastigavam lentamente. Trocavam palavras gentis.
Pediram mais arroz. Ela o serviu. Ele pegou a tigela com torresminhos e
aproximou-a do prato dela: - Posso pôr? - Põe, só um pouquinho.
- Tá bom? - Um pouquinho mais...
Sentindo o gosto, o
tempero, deleitavam-se. A mastigação tornou-se mais rápida. Mãos ansiosas
pegavam garfos, colheres, guardanapos. Bocas salivavam de prazer. Palavras
eram ditas sempre no diminutivo: costelinha, pezinho, lombinho...
Ele
apertou a colher numa orelhinha. Ela, respiração ofegante, disse: - Não
aguento mais...
Ele pegou um rabinho, ela tapou o prato com as mãos
abertas: - Não. Não... - Só mais um pouquinho... - Não.
Chega. Você me mata...
A refeição durou menos de meia hora. Estavam
com muito apetite. Ficaram assim, curtindo a comida gostosa, quente, até
esvaziar os pratos. Ela, então, pegou o suco de laranja, bebeu e ele viu
que seus lábios molhados brilhavam. Bebericou o chope. Ela viu que os
lábios dele brilhavam. Enxugaram a boca, satisfeitos, saciados. Deixaram
os guardanapos suavemente sobre a mesa. Ficaram longo tempo num silêncio
cheio de prazer. Ela sorriu. Ele sorriu. Ela disse baixinho: - Nunca
comi tanto... Você tem um apetite...
Ele, gentil: - Você
também...
Os dois se olharam, olhos nos olhos, e cochicharam ao
mesmo tempo, como se fosse um coro: - Vamos descansar um pouco. Depois
a gente pede a sobremesa.
(RT, 23 de dezembro/2006)
CooJornal nº 508
Braz Chediak,
cineasta e escritor
Três Corações, MG
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