03/09/2005
Número - 440
ARQUIVO
BRAZ CHEDIAK |
Braz Chediak
CRIME FEITO EM CASA |
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Tom Jobim dizia que o brasileiro detesta o sucesso do Brasil. É verdade,
por isto o país sempre foi vítima de preconceitos em todos os setores,
do campo à cidade. E dou alguns exemplos: durante muitos anos diziam que
aqui, por ser um país tropical, não era lugar para criação de gado,
principalmente de gado leiteiro, e que o rebanho seria destruído pelos
bernes, carrapatos, etc., etc. Mas com determinação, coragem e trabalho,
muito trabalho, nossos produtores – dos grandes aos micros – provaram o
contrário. Hoje temos um excelente plantel, criamos a raça Girolando, de
dupla aptidão, e somos os maiores exportadores de carne do mundo.
Com a cinematografia foi a mesma coisa. Nunca uma arte foi tão
esculhambada como o cinema brasileiro: “chanchada”, “pornochanchada”,
“melodrama” eram rótulos que usavam para denegrir este segmento de nossa
cultura. Mesmo assim continuamos e hoje temos uma cinematografia forte e
bela. Nossos filmes ganham o mundo e, o que é melhor, se identificam com
nossa gente, suas alegrias, seus sofrimentos, sua vida.
Com a literatura não foi diferente, principalmente a literatura
policial. Antigamente diziam que entre nós a “literatura policial” não
ia pra frente porque no Brasil não há suspeito. A polícia prende, baixa
o pau e ele confessa logo no primeiro capítulo. Isto, quando não a
consideravam subliteratura. Mas nossos escritores não se deixaram
emprenhar pelos ouvidos, ou pelos olhos, e ela sempre fez parte do
universo criador de nossos ficcionistas como prova CRIME FEITO EM
CASA - Contos Policiais Brasileiros, genial antologia organizada por
Flávio Moreira da Costa lançada pela Record Editores. E aqui abro um
parêntese para dizer que “literatura policial” é um gênero e que, como
tal, não exige a presença da polícia ou de um policial, como prova a
esclarecedora conversa entre Ariano Suassuna e Raduan Nassar onde ambos
citam ÉDIPO REI, de Sófocles, e OS IRMÃOS KARAMAZOV de Dostoiévski como
precursores. Fecho o parêntese e volto à antologia CRIME FEITO EM
CASA.
Logo na orelha do livro, Tony Bellotto diz que “Assim como grandes
autores da literatura universal, escritores brasileiros há muito
descobriram no crime um dos mais fascinantes atalhos para tentar
compreender essa complexa entidade a que chamam “alma humana” e que
vivem tentando decifrar. Em Crime feito em casa Flávio Moreira da Costa
nos oferece, além de vislumbres dessa misteriosa e indefinível alma,
diversão e entretenimento de primeira classe. E prova, para os que ainda
duvidam, que o gênero perpetuado pelo americano Edgar Allan Poe pode
combinar literatura de alta qualidade com sedução, fascínio e – acima de
tudo – prazer de ler.”
E que prazer! Que grande prazer encontrar Machado de Assis, Lima
Barreto, João do Rio, Olavo Bilac, ao lado de jovens autores que nos
revelam um Brasil atual, complexo, grande, fascinante. Que grande emoção
reencontrar Medeiros e Albuquerque, Luís Martins e essa grande musa que
foi, e é, Patrícia Galvão, a Pagú, ao lado de Marcos Rey, José Louzeiro,
Dalton Trevisan, Marcílio Moraes, etc., etc. Não cito todos pela única
razão de ter um espaço pequeno para esta crônica, mas tenho certeza
todos prenderão e deliciarão os leitores nesta que é “a primeira
antologia de contos policiais brasileiros – primeira no sentido de uma
evolução histórica, dos primórdios até hoje.”
CRIME FEITO EM CASA é um livro para ser lido do princípio ao fim
de um só fôlego e colocado na cabeceira para ser relido todas as noites
com prazer crescente. É um livro que será amado por todos que apreciam
este gênero que, dia a dia, conquista mais leitores em todo o mundo e
servirá como luz para aqueles que começam agora a grande ventura e
aventura de ser leitor.
Comecei citando Tom Jobim e vou terminar citando Nelson Rodrigues: “O
brasileiro grita a ofensa e cochicha o elogio!” Tem razão o mestre. Mas
quando nos deparamos com uma grande obra como esta não conseguimos
apenas cochichar. Saímos pelas ruas e gritamos aos quatro ventos: o
Brasil é capaz, sim, de produzir a grande literatura policial. E a está
produzindo. E CRIME FEITO EM CASA é uma prova disto.
(03 de setembro/2005)
CooJornal
no 440
Braz Chediak,
cineasta e escritor
Três Corações, MG
brazchediak@bol.com.br
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