Antonio Nahud
MARTIN AMIS O FILHO DO ÊXITO
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O seu pai, Kingsley
Amis, marcou época nos anos 60, sendo considerado um dos angry young men das
letras britânicas. Martin Amis (Oxford, 1949), desde que optou pela
literatura, teve que lutar contra a sombra paterna e os ataques permanentes da
imprensa, numa trajetória marcada por escândalos, polêmicas e sucessos. A sua
rivalidade com com o ex-amigo, e também escritor, Julian Barnes, encheu
páginas de jornais, culminando num livro duro, "The information", uma história
sobre a inveja, o veneno e as tristes figuras de dois escritores.
Ele
viveu nos EUA, Espanha e Portugal. Casado com a escritora norte-americana
Isabel Fonseca, ganhou o Somerset Maugham Award com "The Rachel papers" (1973)
e está sempre entre os finalistas do Booker Pride. Tentou o cinema como
roteirista no banal "Saturno 3"(1980) de Stanley Donen e em "Marte ataca" (o
roteiro foi recusado por Tim Burton), fez crítica literária, foi jornalista e
publicou uma série de novelas recheadas de imagens violentas, fortes e
irônicas. Suas personagens sao narcisistas, viciadas e decadentes. É autor de,
entre outros, "Money"(1984), uma comédia negra onde a personagem central, John
Self, é um bêbado masturbador compulsivo e adepto da pornografia; "Einsten's
monsters" (1987), falando da guerra nuclear; "The moronic inferno" (1987),onde
ataca celebridades intocáveis como Gore Vidal, Normal Mailer e John Updike.
Considerado o escritor mais representativo da sua geraçao, influenciado
pela literatura norte-americana e pela linguagem cinematográfica, odiado pelas
feministas e nomeado pela ótima banda Blur como o seu inspirador oficial, Amis
é um tipo estranho, com olhos de menino marcados pela tormenta e cabelos
assanhados, como uma fera pronta para atacar a qualquer momento. Esteve em
Barcelona para o lançamento de "Experiência", uma labiríntica recriação de sua
própria vida, surgida de uma grave crise pessoal.
Antonio Nahud - Sua
vida foi sempre devassada na mídia. O que pode contar de novo nestas memórias?
Martín Amis - Realmente é difícil contar algo que já não foi dito nos meus
livros. Embora minhas novelas não sejam autobiográficas, de uma certa forma
dramatizam a minha vida. A diferença é que com "Experiência" uso minha memória
consciente, e na ficção uso a subconsciente. Este livro é uma espécie de
correção de certos fatos, deixo claro certas situações exacerbadas por uma
imprensa infame.
AN - Se sente especialmente maltratado pela imprensa?
MA - Claro que sim. A imprensa é um instrumento cego, diz coisas
terríveis, e as pessoas normalmente acreditam que tudo que está nos jornais é
verdade. Sendo assim, existem falsas impressões sobre minha pessoa e neste
livro procuro mostrar o que realmente aconteceu.
AN - Mas muitas
autobiografias não dizem a verdade.
MA - Sei disse, mas não é o meu
caso. Escrevi minhas memórias porque sabia muito acerca de mim próprio, e
senti que podia escrevê-las da forma que tivesse vontade, destacando certos
fatos ou não, porém tinha claro que era necessário dizer a verdade. É que
acredito na escrita como uma coisa íntima, sincera.
AN - O humor
está sempre presente nos seus textos, mas é um humor trágico. Parece gostar do
lado "sujo" da vida, não?
MA - A vida é trágica, portanto a tragédia é,
para mim, a única forma como se desenha a vida humana. É uma característica
visível. Procuro tratar essa tragédia com ironia, afinal no tom cômico existe
um componente de vingança, pois sei que cada dia que passa é mais um passo
para um desgaste dramático da qualidade de vida.
AN - Essa fama de
"enfant terrible", de pessimista crônico, vem do seu pai, Kingsley Amis?
MA - O meu pai foi, é, importante para mim, mas sempre segui meu próprio
caminho. As pessoas pensam que foi fácil construir minha carreira por ser
filho de um escritor famoso. Nada disso. Esforcei-me muito. Eu sempre soube o
que queria fazer da minha vida, escrever foi um compromisso comigo mesmo, não
teve muito a ver com Kingsley.
AN - É comentada sua rivalidade com o
seu pai.
MA - Tínhamos um relacionamento próximo e aberto, não havia
dúvidas dos nossos sentimentos. Acredito na rivalidade literária, porém sempre
dentro de uma mesma geração. Como poderia sentir inveja de Bellow, Nabokov ou
do meu pai? Seria ridículo.
AN - Continua acreditando que Saul Bellow e
Vladimir Nabokov são os seus mestres?
MA - Sim. Bellow é o mais notável
novelista do planeta, é único e genial.
AN - O que pensa dos leitores
que acham a sua prosa forte e ofensiva?
MA - Minha escrita na verdade é
cheia de sentimentos. Não desprezo minhas personagens, gosto de todas elas,
mesmo as piores. Não entendo porque a minha obra choca as pessoas. Procuro
relatar a vida ordinária, universal, comum. Mostro a ansiedade silenciosa.
Minha escrita vem daí, dessa ansiedade silenciosa.
AN - Como se
definiria?
MA - Sou uma criança desprotegida sempre aprendendo regras
novas. É uma definição de Kundera e concordo com ela.
de Barcelona
(novembro 2001)
Antonio Naud é escritor, assessor literário, cineasta
RN
Antonio Júnior segue a caminhada de escritores como Bruce Chatwin, François
Augiéras e Paul Bowles. Viaja por diversos países,
fotografando e escrevendo um diário de viagem. Escreve para as revistas Go
(Barcelona), Veludo (Lisboa), Simples? (SP) e é correspondente do jornal A
Tarde (Salvador, Bahia).
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