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Eletrocardiograma, um velho exame que
continua importante

Dr. Pedro Franco
Um javanês de nome Willen Einthoven, tinha pai
holandês, médico, que foi trabalhar em Java, protetorado holandês e lá nasceu o
gênio, menos conhecido que merece. Einthoven, em 1901, inventou o
eletrocardiograma e pelo invento ganhou o Prêmio Nobel de 1924. Logicamente o
invento foi aprimorado, só que a base, o alicerce, veio da base Einthoven. Vale
frisar, que as três derivações do invento foram preservadas e serviram de base a
todas as demais derivações. Então com 123 anos o invento de Einthoven continua
prestando inestimáveis serviços à humanidade. Parece que estou dando dimensão
excessiva ao eletrocardiograma e não estou. Um autor de nome Katz asseverou, e
com razão, o supremo tribunal das arritmias cardíacas é o eletrocardiograma. Em
qualquer lugar do mundo, o único exame que de fato vai nortear o tratamento de
uma arritmia cardíaca continua sendo o eletrocardiograma, inventado por
Einthoven, em 1901. E lhes conto duas historinhas acontecidas comigo e entram
eletrocardiograma. Conversa com o paciente não precisa ser austera, se quiser
ser lida. E aí vai a história da Pasta Rosa, absolutamente verídica. Comprei
meu primeiro eletrocardiógrafo em 1963, ajudado pelo meu santo Avô Diniz. Fui ser
o “eletrocardiografista” dos funcionários de uma empresa de grande porte, a
convite do médico chefe, que jogara basquetebol comigo. Bons tempos. Estávamos
em outros tempos. Marcava-se doze funcionários e de vinte em vinte minutos se
fazia um eletrocardiograma. Vinte e quatro horas depois entregava
eletrocardiogramas montados e com os respectivos laudos, para os pacientes serem
examinados pelo Médico Clínico. Que não fosse perder aquele serviço, muito bem
vindo para um chefe de família, já com mulher, filha de três anos e um varão a
caminho, filho este que agora é um muito bem vindo colega em Cardiologia.
Primeiro dia, tudo bem. No segundo dia de exames, o primeiro funcionário a fazer
o eletrocardiograma é o Sr. José. Prepara-se o paciente, liga-se o aparelho e a
agulha, que deveria deixar traçado no papel parafinado, zune e risca
desordenadamente. Mexo no aparelho, tento acertá-lo e nada consigo. Desmarco os
outros onze pacientes e me dirijo ao consertador de eletrocardiógrafos. Mostro o
papel com os riscos desordenados, o consertador julga interessante, pede que
deixe o aparelho e volte no dia seguinte. Àquela altura o Viso-Cardiette, que me
serviu por muitos anos, já saíra da garantia. Volto no dia seguinte.
− Doutor,
vai ser caro. Tive que mexer em todo o seu aparelho, tropicalizei (soube depois
que tropicalizar era tirar umidade) e não encontrei defeito. Preço, um quarto do
custo do aparelho. Contava este acontecimento nos cursos anuais de
Eletrocardiografia, porque o caso é didático. Aparelho consertado, remarcam-se
os mesmos pacientes. Vem o Sr. José, prepara-se para o exame e a agulha volta a
não obedecer. Repete-se tudo, desmarcação etc. Nova ida ao consertador. Testes
com o simulador de paciente.
−−
Seu eletrocardiógrafo está perfeito, mas vou
verificar tudo de novo. Volto no dia seguinte e nem dormi direito.
− Não
entendo, seu aparelho está perfeito! Marco nova ida à fábrica. E cito Nelson
Rodrigues. “Sem sorte não se chupa nem um Chica-bom. Você pode engasgar com o
palito, ou ser atropelado pela carrocinha.” É fato. Terceira tentativa: Seu José
tinha saído e em seu lugar vem Seu João. Traçado perfeito! Ave César! Vem Seu
Agenor. Traçado perfeito. Chega o Sr. José. Sou só sorrisos. Deita-se, ligo o
aparelho. A agulha zune desordenadamente. Era o Sr. José, então. Próteses
metálicas não tinha, já perguntara no primeiro dia.
−−
Onde trabalha?
−−
Na
Galvanoplastia.
−−
Há pó de metal?
−−
Muito. Pó que se entranhava na pele e criava
correntes secundárias, que impediam a realização do eletrocardiograma. Pedi à
enfermeira que me conseguisse Pasta Rosa.
−−
Pasta Rosa de limpeza de panelas?
−−
É. E nos pacientes da Galvanoplastia passei a limpar o local onde colocava os
eletródios com a Pasta Rosa. Aprendi e que esta história sirva para outros
colegas iniciantes. E todos devem saber que no início de uma profissão aparecem
problemas complicados. Alguns, por incrível que pareça, podem ser sanados com
algo semelhante à Pasta Rosa.
Pedro Franco é médico cardiologista
RJ pdaf35@gmail.com
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Direção e Editoria
Irene Serra
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