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O binômio médico-paciente

Pedro Franco
A consulta terminou, o cliente saiu e o
médico com a impressão de que, na consulta, algo aconteceu que impedirá a volta
do paciente. Porém, foi consultado com atenção, examinado segundo a melhor
técnica, medicado de acordo com a mais apurada terapêutica e três exames
necessários foram solicitados. Não houve rusgas durante o exame, mas o enfermo
não voltará, diz-lhe a experiência médica de anos e anos, sensação esta
confirmada pelo tempo, em muitos casos. Em outras ocasiões a primeira consulta é
a impressão de relacionamento antigo, de casamento técnico perfeito, um conjunto
harmônico que vai frutificar em benefício do paciente, na melhora de seu estado
de saúde, por toda a vida.
Esta constatação se faz em todos os níveis,
desde a Medicina Previdenciária até na Clínica mais sofisticada e passando
também pelo atendimento universitário a indigentes. Logicamente que o
relacionamento, bom ou mal, bases maiores para explicar esta atração técnica, ou
o desagrado pessoal, acontecerá mais nos consultórios particulares, onde as
peculiaridades do local e o fator tempo ajudam, ou prejudicam, as afinidades
entre médicos e pacientes. Li, certa vez, que, em determinado país europeu,
excetuando-se as situações de emergência, o médico pode recusar o cliente, face
a antipatia. Esta conduta choca aos que fizeram o juramento hipocrático e se
moldaram na escola do servir, ser útil da melhor e indistinta forma. Mas, quando
se penetra na profissão e em suas dificuldades, pensa-se duas vezes antes de
condenar irrestritamente o referido código de ética, francês, se não me falha a
memória, Pois, na prática, percebe-se que deve haver um misto de respeito,
hierarquia, amizade, confiança técnica-pessoal e obediência na relação paciente
com o médico, que, dentro dos limites funcionais, deve ser mantida também em
sentido contrário, do médico para com o paciente. De forma meio indefinida
poderíamos dizer que deve haver calor humano no trato médico-paciente,
paciente-médico. Contou-me um sábio e aposentado colega, também médico da Caixa
Econômica, que seu pai, clínico tarimbado e mordaz, dizia que “os porcos se
juntam pelo ronco”. Diria eu, que nós nos agrupamos e nos inter-relacionamos
pelas nossas afinidades. A cultura do médico e a do paciente, e talvez devesse,
ao invés de cultura, usar o termo vivência, para apelidar o cabedal de
experiência de vida dos componentes do binômio, é importante para a
solidificação do inter-relacionamento. Poderia exemplificar com a figura,
lamentavelmente em extinção, do médico de família, onde o carinho presidia o
relacionamento profissional.
Para retirar deste artigo o ar de ensaio,
que não pretendo fazer, termino com um pensamento e um conselho, sabendo já que
o primeiro pode parecer pretencioso e o segundo peca pelo título: conselho. O
primeiro, a Medicina precisa ter bases científicas, mas é arte, e esta relação
entre médico e paciente precisa ter bases científicas definidas, porém o que pesa
mesmo é a arte individual dos envolvidos e, às vezes, por causas ainda
desconhecidas, os dois não se cruzam. Cheguei lá, os dois não se cruzam! O
conselho aí vai: procurem ter um médico assistente e, principalmente, procurem
se “cruzar” com este médico. O perfeito e harmônico funcionamento do binômio
ajuda muito nas horas tristes e sérias das enfermidades graves.
Pedro Franco é médico cardiologista
RJ pdaf35@gmail.com
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Direção e Editoria
Irene Serra
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