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A força da mandioca

Tutu de feijão, pirão de peixe, pato no tucupi, tacacá, farofa d'água, beiju,
bolo de carimã, tapioca: delícias regionais com algo em comum, além do jeitinho
brasileiro. Se pensou mandioca, acertou em cheio. Alimento energético,
riquíssimo em carboidratos (amido e açúcares), a Maninot esculenta, como a
denominam os cientistas, tem ingresso em qualquer refeição. Cozida, acompanhada
de manteiga, mel ou geleia, faz as vezes do pão no café da manhã, onde participa
também como ingrediente de bolos e biscoitos. Em almoços e jantares, sob a forma
de farinha, é companheira fiel do feijão com arroz, além de complementar carnes,
peixes e aves.
Vem de longe a força da mandioca. Os historiadores
especulam que teria sido descoberta antes da chegada dos portugueses ao Brasil,
em 1500, pelas mulheres da tribo dos tapuias. Daí, aos poucos, sua cultura,
alcançou o restante da território brasileiro e outras regiões das Américas do
Sul e Central. No século XVII, os bandeirantes aprenderam o costume indígena e
passaram a marcar caminhos plantando mandioca. Na volta, com as ramas já
crescidas, as raízes, raladas e secas ao sol, eram transformadas na rústica, mas
regeneradora, "farinha de guerra".
Durante o período colonial
(1500-1822), o cultivo foi incentivado até por decreto régio. Senhores de
engenho eram obrigados a plantá-la, em quantidades proporcionais ao número de
escravos - tanto que se tornaria símbolo de riqueza, usada para avaliar a
fortuna pessoal dos proprietários de terra.
Aipim para os cariocas,
macaxeira entre os nordestinos, manduba ou mandubimana no norte: tudo mandioca.
A mistura usual com o feijão não está errada, mas deixa a desejar. Explica-se:
"O feijão é alimento rico em proteínas, que faltam à mandioca. Porém, ambos são
carentes em metionina, aminoácido essencial". O casamento só fica perfeito com a
participação de arroz ou carne, que garantem balanceamento adequado de
aminoácidos.
Carboidrato por excelência, fonte de vitaminas e
sais minerais
A
propósito: o amido transforma-se em açúcar. Mas isso não significa que seja
indiferente consumir mandioca ou açúcar de cana, pois a absorção da mandioca é
mais lenta. Já no açúcar, a queima é rápida demais, por isso, ele é melhor
aproveitado pelo organismo, sendo que a energia excedente acaba se acumulando
nos tecidos adiposos sob a forma de gordura.
Para quem está acima do peso
é bom não abusar, pois esta raiz é rica em calorias.
A mandioca porém,
não é só amido, É boa também em vitaminas e sais minerais. Para começar, nela
encontramos vitamina C e niacina, do complexo B. Uma é a guardiã dos tecidos e
vasos sanguíneos, protetora do corpo contra infecções, além de favorecer a
absorção do ferro. A outra atua no metabolismo dos aminoácidos, gorduras e
carboidratos, influenciando ainda a quebra da glicose para produção de energia
celular.
As mandiocas de polpa amarelada apresentam vantagem adicional:
bons teores de caroteno, que é transformado pelo organismo em retinol ou
vitamina A, essencial à visão, pele e mucosas.
Quanto aos sais minerais,
a mandioca oferece cálcio, fósforo e ferro. O cálcio é fundamental aos ossos,
dentes e coagulação do sangue (aí recebe ajuda do fósforo, que também combate a
fadiga mental). O ferro é indispensável ao trabalho da hemoglobina, e levar
oxigênio a todos os tecidos do organismo.
Folha, fonte proteica
Se
a raiz da mandioca contém amido excessivo, já as folhas possuem proteínas de boa
digestibilidade, sendo que, desidratadas, podem ser consumidas na alimentação
humana. Elas são muito ricas em vitamina A e ferro (mais até do que a carne e o
leite), vitamina B1, B2, C, cálcio e os micronutrientes zinco, magnésio e cobre,
que, mesmo em pequenas quantidades, são fundamentais para cerca de 80 reações
enzimáticas.
Jogue fora o veneno
As inúmeras
variedades de mandioca podem ser divididas em 2 grupos: mansas ou bravas, de
acordo com a quantidade de ácido presente na polpa crua das raízes. Como elas
não se diferem na aparência, a única maneira de distinguir um tipo do outro é
degustar (sem engolir) um pedacinho de mandioca crua - quanto mais amarga, maior
a quantidade de veneno.
Mesmo as mandiocas de consumo doméstico precisam
ser desintoxicadas. Para isso, basta cozinhar as raízes descascadas (sem tampar
a panela) e jogar fora a água de cocção. Até na a preparação de sopas ou cremes,
não utilize a água em que a mandioca foi cozida. Casos de intoxicação por
mandioca mansa só ocorrem com pessoas carentes em aminoácidos sulfurados. Mais
um motivo para combinar a mandioca com alimentos proteicos.
Alguns
cuidados ao comprar mandioca: repare se o miolo e a ponta apresentam coloração
uniforme, sem manchas pretas; e a polpa deve conservar, ainda, certa umidade e
soltar-se facilmente da casca, o que indicam que a raiz está fresca.
Conserve e prepare a mandioca corretamente
Não a deixe
por mais de dois dias fora da geladeira. Se não for consumi-la logo, descasque-a
e guarde-a na geladeira em vasilha com água, o que preserva o alimento.
Para preparar, lave bem e corte em pedaços grandes, de preferência de um tamanho
uniforme, para cozinhar todos aos mesmo tempo. Em seguida, faça em cada pedaço
um corte longitudinal, de forma a atingir toda a espessura da casca. Desprenda-a
com a ponta da faca. Cozinhe em água e sal, mas só coloque a mandioca quando a
água estiver fervendo. Não tampe a panela, que é para o ácido cianídrico
volatizar-se. Sendo de boa qualidade, estará cozida em 15 a 20 minutos. Escoe
bem.
Esses cuidados são desnecessários quando utilizamos derivados da
mandioca, inclusive os diferentes tipos de farinha. A mandioca é finamente
fracionada, aumentando o contato do glicosídeo cianogênico com a enzima
linamarase e o ácido cianídrico resultante é facilmente degradado por
aquecimento, luz e ventilação. Além disso, no processo industrial, a farinha
é submetida a temperaturas de 100 a 180 graus centígrados, tornando inócuo o
veneno residual.
Acompanhe outros detalhes da fabricação das
farinhas
Na de raspa, muito usada em panificação como
complemento da farinha de trigo, as raízes são lavadas, descascadas, picadas e
prensadas, para se retirar o excesso de água; a massa resultante é seca, moída e
peneirada, até atingir textura próxima à da farinha de trigo.
Na de
mesa, o processo é parecido. Só que as raízes são apenas raladas e, depois da
prensagem, os torrões são esfarelados e peneirados em máquina apropriada (quando
eliminam-se parte das fibras), antes de seguirem para a torração. Cumprida esta
ultima etapa, a farinha está pronta para ser usada em farofas, pirões, paçocas,
cuscuzes, frituras à milanesa e, principalmente, como coadjuvante do feijão.
A mandioca na medicina popular
Com a farinha
preparam-se cataplasmas emolientes empregados com eficiência em abcessos,
inflamações e queimaduras. Já a raiz cozida ou o mingau ajudam a combater
disenterias e diarreias. Isso porque a mandioca é muito adstringente. Ela torna
o bolo fecal mais compacto. Por serem nutritivos e de fácil digestão, ao
mingaus são recomendados também a convalescentes, crianças e pessoas idosas.
Além do uso popular, pesquisas ainda incompletas sugerem que os componentes
ativos da planta poderiam ter ação preventiva antitumoral. A explicação é que as
células anormais seriam destituídas da enzima rodanase, responsável pela
eliminação do glicosídeo cianogênico. Resultado: o veneno, não destruído pela
célula deficiente, acaba por fazê-la sucumbir. Isso é, por enquanto, apenas
hipótese, mas conta com um argumento de peso: o nordeste. onde o consumo de
mandioca é altíssimo, apresenta o menor índice de câncer de intestino no país.
Receitas:
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Direção e Editoria
Irene Serra
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